sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

A GATA ESTEFÂNIA E A JUSTIÇA


A minha gata Estefãnia

         Sou o primeiro a confessar que é muito difícil penetrar no pensamento de um animal: se já não é fácil perceber os racionais, imagine-se entender os ditos irracionais!
No meu caso com a convivência já vou entendendo a minha Estefânia, quase silenciosa companheira das minhas solidões. Mia assim, mia cozido, tem modos e maneiras, irracionais já se vê, de mostrar bem o que quer e, adivinho eu, o que pensa.
Por mim procuro sempre dar-lhe o melhor da estima e do peixinho para ela comer porque o não dispensa.
Resolvi com toda a antecipação, começar a treiná-la em termos alimentares para se habituar a emagrecer, pelo menos até 2013 ou até ao final da década seguinte, atitude aconselhável por mais prudente.
Foi quando aconteceu cair-me nas mãos um sermão do Padre Vieira, vindo lá dos confins do século XVII. Como era coisa com peixes, resolvi investigar pelo sermão, podia ser que houvesse ali uma sábia ajuda para a dieta da Estefânia, quem sabe…
Dizia o jesuíta…tal, tal e “…que nessa riqueza tendes um grande perigo, porque todos os que se aproveitam dos bens dos naufragantes, ficam excomungados e malditos”.
Mais para a frente lia-se…”Esta pena de excomunhão, que é gravíssima, não se põe a vós (peixes) senão aos homens mas (…) tem mostrado Deus que quando os animais cometem materialmente o que é proibido por esta lei, também eles encorrem, por seu modo, nas penas dela e, no mesmo ponto começam a definhar, até que acabem miseravelmente.” Mas TODOS são excomungados, TODOS??
Peço desculpa à minha gata de mudar o meu pensamento do seu cachucho para a pesca oculta que se pratica por aí nos altos mares da mestrança, à vista de muitos grandes da lei e da Justiça,
A pobre felina nunca comerá do peixe apanhado nessa pesca do alto… Tubarão gordo e fresco, não é para os da laia dela! A Estefânia terá que se contentar com umas postecas de chicharro. E vá, vá!
Porque os bens marítimos provenientes de naufragantes, são de imediato congelados a bom recato das tempestades, talvez nas helvéticas neves ou nas quentes ilhas do Caribe. E nada de ligar ao que o padre jesuíta dizia, parvo e antiquado!
Sabe-se até que esses zelosos congeladores de tesouros, são muito acarinhados, de tal sorte e arte que, quando por qualquer erro de cálculo são apanhados a gozar o congelado doce fruito (isento de impostos e maçadas), não há forças legais, nem as mais altas, capazes de os mudar das Caraíbas para um seguro “hotel do Estado” em Pinheiro da Cruz!
Continuando a conversar com a Estefânia, contei-lhe que o Sr. Martins sapateiro cá da loja de baixo (agora fechada), apanhou uns mesitos de prisão por ter sido fisgado a pescar nas docas uma fedorenta tainha para o jantar. Discutiu com o polícia, as desculpas do costume, que era para comer, que não havia dinheiro para a licença, isso, mas como não tinha bulas que chegassem para pagar a um advogado, foi mesmo ao tribunal no caminho para o calabouço.
Mas nada de descrer que a Justiça não funciona! Funciona! Então não se viu?
- Eh! Estefânia! Vem cá! Onde vais com esse ar de desconfiança?

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